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quarta-feira, fevereiro 09, 2005
por Rodrigo R. Pedroso
Um dos lugares-comuns da cultura de nossa época é o sentido extremamente negativo emprestado à palavra “repressão” e a tudo o que pode ela significar. A repressão é tida como o resumo e a fonte dos males que afligem o homem, uma obscenidade a que não se deve fazer referência sem o devido anátema. Basta que uma instituição seja apontada como “repressora”, para estar inquinada de vício insanável. Em meus tempos de criança, lembro-me de que fazia muito sucesso um conjunto de portorriquenhos, que se requebrava cantando: “No se reprima! No se reprima!” Dentro dessa perspectiva, urge eliminar qualquer forma de repressão, e subverter as instituições e os valores herdados das gerações passadas, para instaurar uma sociedade absolutamente não repressiva.
O problema é que semelhante preconceito reflete uma incompreensão radical do significado da cultura. Efetivamente, toda a cultura é edificada sobre a repressão. Sem esta, não há civilização, não há linguagem, não há vida social, não há educação. Pretender eliminar a repressão em todas as suas formas, é buscar a desintegração da vida em sociedade, e rebaixar o estatuto humano à condição dos irracionais.
Mais que todas as outras, é condenada a repressão sexual. Todavia, imaginem vocês as consequências reais de uma sexualidade absolutamente liberada, sem qualquer espécie de repressão. Em primeiro lugar, não haveria mais família, que é a base da vida social. Que freio encontrariam os egoísmos humanos? Eis o homem embrutecido, escravizado pelos próprios instintos. E nas últimas décadas temos assistido as pavorosas consequências de uma sexualidade que não é reprimida pela razão: os casamentos fracassados, as crianças que crescem sem pai, as adolescentes gestantes, a violência e a insatisfação generalizada. E há ainda os hipócritas que asseveram que o que faz infelicidade é a repressão sexual...
A premissa implícita na radical condenação da repressão é a de que nada há no homem que deva ser reprimido. Ocorre que este pressuposto é falso: tanto no interior do indivíduo, como na sociedade, estão presentes tendências dissolventes e desintegradoras, que precisam ser reprimidas. Liberar essas tendências desordenadas, é abrir as portas para o fracasso, tanto na vida individual, como na social. Um homem concentrado, por exemplo, é um homem reprimido; para manter a atenção em algo, é necessário reprimir as tendências interiores que conduzem à dispersão. De modo que toda a arte, ou pelo menos a arte de boa qualidade, é produto da repressão: ninguém sequer aprende a tocar piano ou violão se não for capaz de reprimir-se.
A repressão é própria do homem, em relação aos outros animais, porque apenas o homem, animal dotado de razão e de vontade livre, é capaz de reprimir seus próprios desejos e instintos em função de um ideal maior. Não é belo alguém ser senhor de si próprio? Ora, o autodomínio é impossível sem repressão. Por isso, todo o palavrório que se difunde contra a repressão visa, intencionalmente ou não, à desumanização do homem, e à sua escravização pelas paixões mais baixas.
A absoluta ausência de repressão é o império da violência, do medo e da injustiça. Não é a repressão que produz a violência, é a ausência dela. Não reprimir a bandidagem, é penalizar injustificadamente os cidadãos honestos e trabalhadores. Não reprimir a baderna e a desordem, é prejudicar o progresso da sociedade. Não reprimir a violência e a injustiça, equivale a premiá-las, ao mesmo tempo em que se pune a virtude. Em um ambiente assim, eu digo, corrigindo Ruy Barbosa, que não dá vergonha de ser honesto, dá medo.
A paz, assim, é um fruto excelente da repressão. A paz foi definida por Santo Agostinho como sendo “a tranquilidade na ordem” – ora, que ordem manter-se-á tranquila, sem a repressão das forças centrífugas da desordem?
A idéia, portanto, de que a repressão é sempre uma coisa má e detestável, não pode ser sinal de juventude, nem tampouco de vitalidade. É antes, o traço característico de uma sociedade que caminha para o fim, de uma civilização senil e caquética, incapaz de identificar as forças que a desagregam.
Um dos lugares-comuns da cultura de nossa época é o sentido extremamente negativo emprestado à palavra “repressão” e a tudo o que pode ela significar. A repressão é tida como o resumo e a fonte dos males que afligem o homem, uma obscenidade a que não se deve fazer referência sem o devido anátema. Basta que uma instituição seja apontada como “repressora”, para estar inquinada de vício insanável. Em meus tempos de criança, lembro-me de que fazia muito sucesso um conjunto de portorriquenhos, que se requebrava cantando: “No se reprima! No se reprima!” Dentro dessa perspectiva, urge eliminar qualquer forma de repressão, e subverter as instituições e os valores herdados das gerações passadas, para instaurar uma sociedade absolutamente não repressiva.
O problema é que semelhante preconceito reflete uma incompreensão radical do significado da cultura. Efetivamente, toda a cultura é edificada sobre a repressão. Sem esta, não há civilização, não há linguagem, não há vida social, não há educação. Pretender eliminar a repressão em todas as suas formas, é buscar a desintegração da vida em sociedade, e rebaixar o estatuto humano à condição dos irracionais.
Mais que todas as outras, é condenada a repressão sexual. Todavia, imaginem vocês as consequências reais de uma sexualidade absolutamente liberada, sem qualquer espécie de repressão. Em primeiro lugar, não haveria mais família, que é a base da vida social. Que freio encontrariam os egoísmos humanos? Eis o homem embrutecido, escravizado pelos próprios instintos. E nas últimas décadas temos assistido as pavorosas consequências de uma sexualidade que não é reprimida pela razão: os casamentos fracassados, as crianças que crescem sem pai, as adolescentes gestantes, a violência e a insatisfação generalizada. E há ainda os hipócritas que asseveram que o que faz infelicidade é a repressão sexual...
A premissa implícita na radical condenação da repressão é a de que nada há no homem que deva ser reprimido. Ocorre que este pressuposto é falso: tanto no interior do indivíduo, como na sociedade, estão presentes tendências dissolventes e desintegradoras, que precisam ser reprimidas. Liberar essas tendências desordenadas, é abrir as portas para o fracasso, tanto na vida individual, como na social. Um homem concentrado, por exemplo, é um homem reprimido; para manter a atenção em algo, é necessário reprimir as tendências interiores que conduzem à dispersão. De modo que toda a arte, ou pelo menos a arte de boa qualidade, é produto da repressão: ninguém sequer aprende a tocar piano ou violão se não for capaz de reprimir-se.
A repressão é própria do homem, em relação aos outros animais, porque apenas o homem, animal dotado de razão e de vontade livre, é capaz de reprimir seus próprios desejos e instintos em função de um ideal maior. Não é belo alguém ser senhor de si próprio? Ora, o autodomínio é impossível sem repressão. Por isso, todo o palavrório que se difunde contra a repressão visa, intencionalmente ou não, à desumanização do homem, e à sua escravização pelas paixões mais baixas.
A absoluta ausência de repressão é o império da violência, do medo e da injustiça. Não é a repressão que produz a violência, é a ausência dela. Não reprimir a bandidagem, é penalizar injustificadamente os cidadãos honestos e trabalhadores. Não reprimir a baderna e a desordem, é prejudicar o progresso da sociedade. Não reprimir a violência e a injustiça, equivale a premiá-las, ao mesmo tempo em que se pune a virtude. Em um ambiente assim, eu digo, corrigindo Ruy Barbosa, que não dá vergonha de ser honesto, dá medo.
A paz, assim, é um fruto excelente da repressão. A paz foi definida por Santo Agostinho como sendo “a tranquilidade na ordem” – ora, que ordem manter-se-á tranquila, sem a repressão das forças centrífugas da desordem?
A idéia, portanto, de que a repressão é sempre uma coisa má e detestável, não pode ser sinal de juventude, nem tampouco de vitalidade. É antes, o traço característico de uma sociedade que caminha para o fim, de uma civilização senil e caquética, incapaz de identificar as forças que a desagregam.
2:20 PM